Por uma educação de qualidade, SEMPRE!

O Professor Eduardo Leite do Canto pode ser considerado uma fonte de inspiração quando falamos de Ensino. Seguiu sua vocação de lecionar e, hoje, colhe frutos da sua jornada.

Nessa entrevista, ele nos conta detalhes de sua trajetória.

Confira e inspire-se!

  • O senhor iniciou seus estudos superiores no ITA, em Engenharia Eletrônica, mas não concluiu o curso. O que o motivou a mudar para a Unicamp e cursar Química?

Minha vocação era ser professor. Queria cursar Química na Unicamp (Universidade de Campinas) para lecionar. Não tinha mãe nem irmãos. Meu pai — 40 anos mais velho que eu — estava com alguns problemas de saúde, e eu sem condições financeiras para pagar cursinho, então, minhas decisões precisavam ser práticas.
No terceiro ano do ensino médio, prestei uma olimpíada de matemática em Campinas, promovida por um curso recém-criado por iteanos. Os cinco primeiros colocados ganhariam bolsa de estudo no semi-extensivo. Fiquei em 3º lugar. Foi a partir daí que a minha vida começou a mudar. Para melhor. E muito!

Os donos do cursinho tentaram me convencer a prestar vestibular para o ITA, e me contaram diversas histórias de um professor de Química do ensino fundamental do ITA que era um completo ponto fora da curva. Prestei, então, vestibular para os dois. Na Unicamp, em Química, passei em primeiro lugar. No ITA, fui aprovado em Engenharia Eletrônica — sabe-se lá em que colocação; na época não nos informavam e isso era ótimo. 

Escolhi o ITA porque tinha moradia e alimentação, que não era uma decisão irreversível e que me permitiria ser aluno do renomado Professor Doutor Carl Herrmann Weis. A decisão não poderia ter sido mais acertada. Conheci gente de todas as regiões do País, e ampliei meus horizontes intelectuais e fiz muitas e importantes amizades que perduram até hoje.

Weis era um docente capaz de utilizar analogias, informações factuais e experimentos para ensinar, com a mais refinada didática, os mais variados temas da Química e relacioná-los a diversas outras áreas das Ciências da Natureza. 

“Mesmo depois de sair do ITA, mantive contato com ele e até hoje sou amigo de uma de suas filhas, a Suzi. Após o falecimento do Prof. Weis, ela me concedeu acesso a inúmeros documentos referentes à trajetória acadêmica dele. Um dos meus projetos de vida é documentar em vídeo a história desse grande mestre.”

Fui até um amigo veterano que lecionava no Colégio Anglo, em São José dos Campos, e perguntei se ele poderia, dentro de alguns anos, conseguir uma entrevista para mim como professor. Sua resposta me surpreendeu: não seria daqui a alguns anos, mas sim em algumas semanas. Então, consegui ser contratado e comecei a lecionar, quando ainda estava no segundo ano do ITA, e – assim – confirmei minha vocação como professor. Então, eu tinha salário e conseguia me sustentar. Podia, então, pensar em me dedicar à minha verdadeira vocação. No início do quarto semestre do ITA, eu fui para a Unicamp. Continuei lecionando em São José dos Campos e fui contratado também em Campinas.

Prof. Canto lecionando em São José dos Campos
Prof. Canto lecionando em Campinas

Na Unicamp, tive a honra de ter como orientador o Professor Doutor Roberto Rittner Neto, desde a iniciação científica até o doutorado. Profundo conhecedor de física-química orgânica, ele marcou a minha formação, a minha vida e a minha visão sobre a Ciência.

Professor Doutor Roberto Rittner Neto

Lecionando, ganhei novos amigos. Em especial, fiz amizade com uma pessoa espetacular, o Professor Tito Peruzzo. Trabalhamos juntos na autoria de diversos livros por cerca de 25 anos, até a aposentadoria dele. Foi o Tito que, no final de 1988, me apresentou ao Professor Simão Faiguenboim, fundador do Anglo, o primeiro curso pré-vestibular do País. Lecionei na rede até 1999, quando a intensa agenda autoral e editorial determinou minha saída.  

  • Apesar de não ter concluído o ITA, o senhor mantém um forte vínculo com a Turma 88 e apoia a ITAEx. O que o motiva a ter essa relação?

Os integrantes da minha Turma (T88) são muito especiais. Aprendi e aprendo muito com eles. Apesar de eu não ter me formado no ITA, eles me aceitam e me aturam. Sou muito grato a todos por essa oportunidade de convívio.

Quanto ao apoio à ITAEx, a minha própria história de vida é um exemplo de como iniciativas que propiciem acesso dos jovens à educação de qualidade podem ser determinantes para mudar completamente suas vidas. Além disso, como educador, considero fundamental que a sociedade apoie iniciativas voltadas à melhoria da educação. Obviamente, devemos exigir das instâncias governamentais uma educação de qualidade — e essas instâncias têm muito a realizar. Contudo, a sociedade pode e deve contribuir naquilo que puder.

Não há como ficar indiferente a uma iniciativa como essa. É uma questão de se sentir envolvido, de coparticipar e de devolver à sociedade aquilo que recebeu dela. Por isso eu contribuo.

  • Como o aprendizado no Instituto influenciou sua carreira na Educação?

Hoje é consenso nas esferas da educação o papel do professor como mediador. Esse papel é fundamental, mas, ao contrário do que pode inicialmente parecer, não requer apenas aspectos de metodologia didática. Exige muito conhecimento.

Se um docente tem um amplo conhecimento de fatos, conceitos, princípios e técnicas, ele tem condições de distinguir entre o que é essencial e o que é acessório, entre o que pode ser usado na compreensão da vida cotidiana e o que, embora objeto de estudo da área, está distanciado de aplicações práticas.

Estudar no ITA abriu as portas do conhecimento de diversas maneiras. Em primeiro lugar, pelo convívio com pessoas que tinham estudado em outras fontes. Conheci, por intermédio deles, muitos livros bons dos quais nunca tinha ouvido falar. Em segundo lugar, aprendi a preferir os livros técnicos na língua original em que foram publicados e, como consequência, a valorizar o estudo de outros idiomas além do inglês.

Em terceiro, tive acesso ao maravilhoso universo que era a biblioteca do ITA, cujo uso me tornou apto a explorar outras fontes de informação, físicas e digitais.

Em quarto, aprendi sobre pensamento computacional, algoritmos, fluxogramas e linguagens de programação. Isso foi importante para o meu doutorado, para que eu conseguisse implementar a minha própria plataforma de ensino – o Projeto Entenda. Finalmente, e não menos importante, aprendi muito em Matemática, Física e Química, o que formou uma bagagem cultural que me fortaleceu durante toda a minha carreira.

  • O lecionar sobre Ciências da Natureza está na sua trajetória seja de maneira presencial ou remota – por meio do Projeto Entenda. Quando o senhor pensa no que fez, no que faz e no que pretende fazer: qual é o sentimento? Por quê?

Lecionei em diversas escolas, escrevi livros, dei muitos cursos de formação para educadores. Quando algum Ex-Aluno me encontra nas redes e faz um relato da sua trajetória, é muito recompensador. Trabalhar em Educação é instigante, é provocador e mantém a juventude mental. Viajo na ponte aérea Campinas-Curitiba-Campinas uma vez por semana para poder lecionar a alunos que são muito interessados. E não há nada mais gratificante do que ver o brilho nos olhos de quem passa a compreender verdadeiramente alguma coisa que achava difícil.

No caso dos meus livros, se uma minúscula fração dos 22 milhões de exemplares ajudou a mudar a vida de alguém para melhor, então outra recompensa está aí. Hoje, minhas duas filhas escrevem comigo, uma delas é professora de Biologia e a outra é professora de Física, ambas formadas pela Unicamp.

Eu não penso em me aposentar, pois ainda tenho muitos planos. Contudo, eu posso dizer que meu sentimento é de ser plenamente realizado na Educação.

  • No Projeto Entenda e também fora dele, o senhor dá aulas para estudantes e também atua na formação de professores e coordenadores através dos cursos de extensão. Como o senhor analisa esses dois públicos?

São públicos muito similares. Professores e coordenadores só são estudantes há mais tempo — assim como todos os bons profissionais da atualidade devem ser permanentemente estudantes. Quando há interesse do público, a empatia se estabelece em pouco tempo e tudo flui com muita facilidade.

Uma outra coisa em que ambos os públicos são similares é na necessidade de curadoria da informação. Há cerca de três ou quatro décadas, era difícil ter acesso à informação de qualidade. Hoje, a dificuldade é outra: encontrar informação confiável e relevante apresentada de maneira didática. Aí entra em cena a curadoria, o papel do educador em ajudar na seleção das fontes a serem usadas.

Os dois públicos diferem em aspectos como a experiência de vida, os conhecimentos a serem transmitidos e a sintonia do discurso, especialmente quanto ao vocabulário utilizado.

  • O que o senhor pode nos falar sobre o “lecionar” de hoje se comparado ao “lecionar” de quando começou?

Algumas das diferenças dizem respeito ao “repertório” e à “sensação de conhecer” dos estudantes. Hoje, o repertório de vida prática dos estudantes é um pouco mais restrito. Há duas ou três décadas, era possível explorar uma gama maior de conhecimentos do mundo físico para instigar a curiosidade e explicar conceitos de Ciências. Hoje, frequentemente é preciso descrever primeiro alguns fatos para, só então, interpretá-los. Quanto à sensação de conhecimento, a possibilidade de buscar na internet e encontrar rapidamente conteúdos de natureza factual cria a falsa sensação de “conhecer”.

Mas acessar é diferente de aprender, assim como informação é diferente de conhecimento. O aprendizado só é atingido quando informações são processadas pelo indivíduo e isso modifica estruturas cognitivas para não apenas incluir novos conceitos, mas também reformular alguns que já existiam.

Outra diferença está na capacidade de se concentrar em algo por determinado período de tempo. Essa capacidade parece estar diminuindo progressivamente e há indícios de que isso tem relação com a celeridade com que os conteúdos das redes sociais são apresentados, vistos e esquecidos.

Nem tudo, porém, mudou para pior. Hoje há, pelo menos em linhas gerais, um engajamento maior dos estudantes com causas como igualdade e respeito aos direitos individuais, bem como uma maior capacidade de compreender como utilizar novas tecnologias.

  • O que podemos dizer de Eduardo Leite do Canto fora das salas de aula? O senhor possui algum hobby?

Sou ávido por conhecimentos, sobretudo aqueles com utilidade prática para entender o mundo. Assim, meu hobby é estudar diversos assuntos, sobretudo temas de Física, Biologia, Bioquímica, Farmacologia, Design, TI e História.

Então, fica aqui uma sugestão para quem está na educação básica ou no início do ensino superior: estude muito, pois o conhecimento tem o imenso poder de mudar sua vida para melhor!

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