Mulheres no espaço

por | set 16, 2023 | Blog | 0 Comentários

A 35ª edição do SSP (Space Studies Program), maior encontro de estudos do espaço em todo o mundo, mostrou que o Brasil é capaz de contribuir muito com a comunidade internacional nesta área, produzindo conhecimento e profissionais altamente capacitados.

A avaliação é da professora do programa de Ciências e Tecnologias Espaciais do ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica), Priscila Fernandes.

Com o apoio da ITAEx, ela foi um dos quatro docentes do instituto que tiveram a oportunidade de participar do SSP, organizado anualmente pela ISU (International Space University).

A edição de 2023 do programa aconteceu pela primeira vez no Brasil, reunindo, por dois meses, cerca de 300 pesquisadores de mais de 30 países em São José dos Campos (SP), berço do ITA e da indústria aeroespacial do país – o encerramento aconteceu no dia 25 de agosto.

Além da participação como pesquisadora, Priscila Fernandes foi uma das convidadas especiais de um dos painéis do SSP, o “Mulheres no Espaço”, que discutiu o papel e as contribuições de mulheres brasileiras nas carreiras de ciências, inovação e engenharias. O debate também teve a participação da executiva global da Siemens Cláudia Massei, ex-aluna do ITA (T05) que, hoje, também atua como voluntária na ITAEx.

A seguir, Priscila – que também é coordenadora do Laboratório de Bioengenharia do ITA e membro do grupo de trabalho “Mulheres na Engenharia” da ABENGE (Associação Brasileira de Ensino de Engenharia) – conta como foi sua experiência no SSP e as contribuições deste importante evento para o fortalecimento da ciência no país. Confira:

Na sua opinião, qual é o saldo do SSP 2023? Que legado ele deixa para o Brasil?

Priscila Fernandes – A SSP é um curso no modelo de imersão de 9 semanas, e discute diversas disciplinas contempladas no setor espacial, desde as engenharias, astronomia, medicina, área de administração e novos negócios, economia, política, leis, artes… Acho que o maior legado é o caráter interdisciplinar. O setor espacial embora fortemente técnico (das engenharias e das ciências exatas) é também um setor de outras áreas do conhecimento. Para o Brasil, que é um país grande com excelentes recursos humanos, forte em pesquisas em diversos setores, é um legado de expansão de fronteiras, perceber que somos capazes de contribuir fortemente com o setor espacial internacional.

Professora Priscila Fernandes, do ITA
Professora Priscila Fernandes (Foto: Divulgação/ITA)

E pessoalmente? O que foi mais marcante para você?

Priscila Fernandes – Sem dúvida ter tido a oportunidade de trabalhar com uma enorme diversidade de pessoas, de diferentes culturas e áreas de atuação. A experiência de internacionalização não apenas bilateral, que acontece quando viajamos pra outro país, mas estar em atividades acadêmicas, culturais, de lazer, com pessoas dos muitos cantos do mundo, aprender com eles, entender suas perspectivas, e compartilhar interesses e experiências comuns. Foi maravilhoso!

Você foi uma das convidadas especiais de um dos painéis do programa, o “Mulheres no Espaço”. Como foi essa experiência?

Priscila Fernandes – Essa foi também uma experiência incrível. Foi uma organização da Niamh Shaw, que é uma comunicadora irlandesa, escritora e uma ativista para melhorar a compreensão pública das ciências, sobretudo na área espacial. A ideia do painel foi de discutir como é atuar profissionalmente em carreiras de ciências, inovação e engenharias na perspectiva de mulheres brasileiras. Tive a honra de conversar com a Cláudia [Massei] e com a Duilia [de Mello, astrônoma, vice-reitora da Universidade Católica Washington e colaboradora NASA], que são pessoas maravilhosas, expoentes em suas áreas, e compartilhar com elas histórias do nosso cotidiano, profissionais, ressaltar o quanto conquistamos em termos de reconhecimento profissional, e o quanto ainda temos que avançar como sociedade para alcançarmos o potencial pleno da humanidade, que é o de não deixar ninguém de fora no desenvolvimento das ciências, do pensamento, da academia, enfim.

Priscila Fernandes com colegas do SSP
Priscila (à direita, de azul) com colegas do Humanities Department no SSP (Foto: Acervo pessoal)

De quais outras atividades você participou?

Priscila Fernandes – O curso tem uma primeira etapa de aulas teóricas, chamada de Core Lectures, com especialistas de cada área, com assuntos variados, desde astronomia, propulsão, órbitas, satélites, GNSS, direito internacional, medicina espacial, mercados e economia. É uma jornada bastante densa, com testes de conhecimento e provas dissertativas. Todos fazem essa parte em um grande grupo de quase 100 pessoas. É uma fase muito especial, onde passamos muitas horas juntos, estudamos juntos e formamos um grande senso de comunidade.

A segunda fase é uma fase de departamentos. Eu fiz parte do departamento de humanidades, em que discutimos educação, artes, formação profissional, estudos de futuros, antropologia… Existem 7 outros departamentos, e são, portanto, atividades em pequenos grupos. Nessa etapa com esse grupo específico, tivemos a oportunidade de discutir aspectos culturais, sociais, éticos e estéticos a partir de uma perspectiva muito rica, com tempo para reflexão num ambiente extremamente respeitoso.

Na terceira etapa, então, temos o projeto em equipe, Team Project, em outra conformação de grupo, com cerca de 20 pessoas cada. Eu trabalhei na equipe de Segurança Hídrica [Water Security]. Foi maravilhoso desenvolver um trabalho acadêmico, desde o levantamento bibliográfico até a monografia final. Aprendi muitos sistemas diferentes de gestão de projetos, me inspirei pela diversidade de perfis de trabalho, de perspectivas disciplinares e dos talentos individuais de cada um da equipe. Foi uma experiência que está ainda em reverberação. Estamos escrevendo juntos um trabalho que será apresentado no IAC-23, 74th International Astronautical Congress, que vai acontecer em outubro, em Baku, no Azerbaijão.

Além das atividades acadêmicas tivemos viagens de trabalho, visitas técnicas, atividades culturais, tudo em um modelo de imersão, todos hospedados no mesmo hotel, com refeições em grupo, estimulados para a troca de experiências e a construção de colaborações duradouras.

Qual foi a importância do apoio da ITAEx nesta sua jornada?

Priscila Fernandes – A ITAEx acreditou que essa seria uma oportunidade para professores do ITA muito antes de eu ter essa dimensão. A ITAEx ofertou ao ITA uma bolsa para que selecionasse docentes para participarem do curso, acreditando desde o início que uma atividade como essa poderia colaborar para a formação de docentes da nossa instituição. Fomos quatro docentes do ITA selecionados para fazer o curso, dentre os quase 100 alunos da turma 2023 [do SSP]. Mas, mais do que isso, a ITAEx acompanhou o curso em diversos momentos, participou dos eventos abertos e nos deu todo o apoio com sua presença e estímulo para que pudéssemos tirar o máximo da experiência. E até agora, após o curso, tem nos apoiados para que essa experiência possa ser replicada para o maior número de docentes possível.

Que mensagem você gostaria de deixar para quem pretende se dedicar aos estudos do espaço?

Priscila Fernandes – Como já declarado nos três pilares da ISU, a atividade espacial é uma atividade interdisciplinar, internacional e intercultural. Independente da sua área técnica, saber trabalhar em um ambiente complexo é condição fundamental para poder atuar no setor espacial. Visto do espaço, o planeta Terra, assim como todos os outros, não têm fronteiras. E nas grandezas astronômicas, e nas condições de vida no espaço, a humanidade se une mais do que se separa. Vivemos uma época interessantíssima na exploração espacial. E temos aqui na Terra problemas de complexidade enorme para resolver também. As soluções em todos esses casos são produto do trabalho colaborativo, do respeito à diversidade e do esforço conjunto para garantir a vida a toda humanidade.

Saiba mais sobre o Space Studies Program no site: https://www.isunet.edu/ssp/.

Priscila Fernandes com colegas ao final de uma das atividades do SSP
Priscila Fernandes com colegas pesquisadores ao final de uma das atividades do SSP (Foto: Acervo pessoal)

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